segunda-feira, 20 de julho de 2009

Evangelhos: 3º Lucas

Lucas
O evangelho de Lucas é considerado o mais belo de todos os quatros, isto porque seu vocabulário é amplo, a gramática e a qualidade de estilo são excelentes. Também contém: momentos de alegria, ação de graças, ênfase às mulheres e ao Espírito Santo e as imortais parábolas do filho pródigo e do bom samaritano.

Autoria

Acredita-se que o autor deste evangelho é o mesmo do livro de Atos, por causa de serem dirigidos a Teófilo1 e de em Atos fazer referência a um volume anterior sobre a obra de Cristo (Lc 1.1-4; At 1.1); sem contar que um completa o outro, pois em Lucas é narrado o que Jesus fez, ensinou e os princípios para uma igreja e em Atos é narrado o desenvolvimento destes ensinamentos, a missão e a expansão desta igreja.
Provavelmente o autor tenha sido Lucas, o companheiro de Paulo (II Tm 4.11) e médico amado (Cl 4.14). Apesar de, no prefácio de Lucas e de Atos o escritor referenciar-se, mostrar o seu propósito e a metodologia das narrativas, ele não diz o seu nome.
É o único evangelho que apresenta a maior quantidade de informações sobre o seu próprio início. No prefácio é possível notar que havia na época muitas outras obras a respeito de Jesus, mas que não eram muito convincentes ou detalhadas e por isso o autor achou que poderia escrever algo mais detalhado, mais ordenado e de mais valor em relação ao que já havia. O autor teve acesso aos testemunhos e escritos sobre Jesus Cristo e por isso investigou-os bem. Percebe-se isto nos relatos particulares a respeito da vida de Jesus que só este evangelho contém.
No Fragmento Muratoriano da igreja de Roma, século II d.C., Irineu, Tertuliano, Orígenes e Eusébio citam Lucas como o autor do evangelho e do livro de Atos. Eusébio escreveu:
"Lucas, por raça um nativo de Antioquia e por profissão médico, tendo-se associado principalmente com Paulo e tendo acompanhado o restante dos apóstolos menos de perto, deixou-nos exemplos da cura de almas, os quais adquiriu deles, em dois livros inspirados, o Evangelho e Atos dos Apóstolos".
Paulo faz referência a Lucas em suas cartas e isto ajuda a verificar se ele foi o autor desses livros ao comparar os conteúdos. Através do vocabulário, da gramática e do estilo nota-se que é alguém que tinha como língua materna o grego e utiliza um estilo grego da mais alta qualidade. Algumas passagens mostram a origem não palestiniana do autor. O nome Lucas2 é de origem grega mas poderia ser também um judeu-helenista.
William K. Hobart, em seu livro, The Medical Language of Saint Luke, após comparar os vocabulários de Lucas e Atos com Hipócrates, Galênio, Dicórides e Areteu (todos médicos do mundo antigo) concluiu que estes livros só poderiam ter sido escrito por um médico, por ser apurado e técnico.
O autor do evangelho demonstra um certo conhecimento ou interesse pela medicina em algumas passagens como em 4.38; 5.18,31; 7.10; 8.443; 21.34; e também no livro de Atos 5.5,10; 9.40, isto porque descreve as doenças e curas efetuadas por Jesus. Para entender melhor eis um exemplo: Lucas 18.25 refere-se a uma agulha de cirurgião belóne4, enquanto que em Mateus 19.24 e Marcos 10.25 referem-se a uma de coser raphis5; e em 8.43 é omitido uma certa acusação aos médicos que consta em Marcos 5.26.
Em Atos 16.10-17; 20.5-15; 21.1-18; 27.1-28.16; a utilização do pronome na 1a pessoa do plural (nós) indica que o autor foi companheiro de Paulo e igualmente, uma testemunha ocular daqueles acontecimentos em várias ocasiões.
Lucas não é citado por Paulo nas cartas a Corinto e a Éfeso e também não esteve lá. Chega-se então à conclusão que o companheiro de Paulo em Atos é realmente Lucas e isto é feito através de um processo de eliminação dos seus companheiros, porque todos os demais (Epafras, Epafrodito, Timóteo, Tíquico, Aristarco, Marcos, João o justo e Demas) o abandonaram.
A teologia paulina também é encontrada nos escritos de Lucas e Atos, sem contar, que existe mais de 100 palavras de Paulo que são encontradas somente em Lucas e Atos. Como Lucas esteve com Paulo por longo tempo, acredita-se que foi influenciado por ele.

Local e Data

Ao levar em conta que Lucas e Atos são frutos do mesmo autor e que o evangelho teve como base ou fonte o evangelho de Marcos, sabe-se que ele tem que ser datado após o ano 60 d.C.
Há uma teoria que acredita que o evangelho foi escrito por volta de 64 d.C., porque nada é citado sobre a morte de Paulo e nem sobre a perseguição imposta por Nero; outra acredita que conforme certos materiais contidos no evangelho só são bem explicados à luz dos últimos anos da guerra judaico-romana (66-70 d.C.), por isso é necessário datá-lo por volta de 70 d.C. (entre as épocas da perseguição sob o domínio de Nero até Domiciano).
Pode-se aceitar que tenha sido escrito antes de Atos e depois do desenvolvimento do cristianismo. Alguns acreditam que como o livro de Atos não menciona as outras duas prisões de Paulo com mais detalhes, mas apenas a primeira, o evangelho foi escrito antes disso. Entretanto uma coisa é certa, muitos escreveram ou tentaram escrever sobre Cristo, conforme é narrado em Lucas 1.1-4. Alguns utilizam o texto de 21.20,21 para dizer que foi escrito após o ano 70 d.C., ou até mesmo, próximo a destruição do Templo.
O local provavelmente teria sido em Acaia, na Antioquia da Síria, mas é melhor afirmar que foi escrito fora da Palestina, no meio de um mundo helenístico e por alguém que estava entre os gentios.

Propósito e Mensagem

O evangelho de Lucas narra a história de Jesus (vida, ministério, morte e ressurreição) como algo cumprido no tempo. No início do evangelho encontra-se vários porquês de sua escrita:
Certeza dos fatos históricos: foi escrito para que Teófilo verificasse a solidez dos ensinamentos que havia recebido (1.4); para mostrar que não era algo especulativo ou inventado, mas que era realmente um fato ocorrido, uma história, pois havia testemunhas oculares. Por isso foi escrito o que se cumpriu entre eles e conforme eles receberam de informações desde o início, dessas testemunhas e dos ministros da Palavra;
Modo ordenado: não significa uma ordem cronológica, mas uma ordem que fizesse com que Teófilo entendesse toda a história, tudo o que aconteceu e acreditasse que era verdade. Isto significa que o autor pesquisou bastante fez uma "investigação de tudo desde o início" a fim de escrever uma narrativa bem lógica, planejada e estruturada;
Judaico-cristão: nota-se que Lucas e Atos relatam que há um problema teológico, ideológico, de exclusividade e imparcialidade que separavam o judaísmo e o cristianismo. Por isso sempre mostram uma possível comunhão entre ambos, já que o cristianismo nasceu do judaísmo e estava tornando-se universal.
A narrativa do nascimento e da infância de Jesus é feita para mostrar que o cristianismo nasceu do meio judaico e que Jesus é o Messias esperado pelos judeus e anunciado pelos profetas. Mostra também que: ele foi criado de acordo com a piedade judaica, circuncidado aos 8 dias após o nascimento (2.21), apresentado no Templo (2.22-24), reconhecido por duas autoridades do judaísmo ortodoxo da época (o justo Simão e a profetisa Ana) quanto à sua natureza (2.25-38), obediente à Lei do Senhor, que gostava de estar no Templo (2.39-50) e, finalmente, que honrava pai e mãe sendo-lhes submisso (2.51,52), tudo conforme a Lei.
É relatada a universalidade do seu ministério e do propósito de salvação divino através dos relatos de sua pregação e ensinamentos nas sinagogas para todos (4.14-30). Mostra que os judeus não o aceitaram e o expulsaram da sinagoga e do Templo (4.28,29; 19.41-48; 23.1,2), por causa do egoísmo por parte dos judeus.
Relata que o cristianismo não é nenhuma ameaça política à autoridade governamental romana e que por eles foi considerado inocente (20.20-26; 23.4,18-23). O ícone do judaísmo, João Batista, foi o seu precursor e confirmou a profecia de Isaías 40.3-5. É narrado uma exortação feita por João Batista aos judeus, que trabalhavam para os romanos, para não serem injustos mas justos e íntegros na sua profissão, sem faltar com a lealdade ao Estado (3.12-14; 19.1-10).
Apresenta o Reino de Deus como sendo um reino transcendente, espiritual e que por isso não constitui nenhuma ameaça ao império romano. Mostra que a morte de João é uma questão ética e moral, mais judaica do que política (3.19,20). Mostra que o problema com Herodes e Jerusalém é religioso e não político (13.31-35) e também que os judeus deveriam estar sujeitos às autoridades romanas, por isso cita o pagamento do tributo a César.
Na acusação do Sinédrio contra Jesus fica bem claro que ele é assassinado pela questão religiosa, de intriga, egoísmo e exclusividade dos judeus e inocenta totalmente os romanos (23).
Lucas apenas quer mostrar que o cristianismo é puramente fruto do judaísmo, que os líderes judeus não entendiam as Escrituras e por isso agiam de forma errônea. Apresenta o AT como sendo cumprido pelo cristianismo e mostra que os judeus são os causadores das confusões. Sempre isenta os romanos e mostra que não há intriga entre eles, apenas o devido respeito.
Parousia (presença, aparição): o autor narra a respeito de um dos maiores problemas enfrentados pelos cristãos, que era a demora da volta de Jesus Cristo. Já que muitos estavam duvidando de que voltaria, conforme II Pedro 3.4, por isso escreve fazendo uma interpretação acerca das palavras de Jesus sobre a consumação. Tenta mostrar desta forma, que do mesmo modo que o Messias havia demorado para os antigos, também aconteceria com eles, mas ocorreria no tempo certo. Isso motiva a esperança na vinda do Reino de Deus e ainda destaca que este Reino é uma realidade a ser vivida (práxis) no ministério de cada um, ou melhor, na vida de cada um, como foi com Jesus Cristo.
As narrativas encontradas no evangelho mostram Jesus como sendo um membro da humanidade. Mostram que Jesus era humano como qualquer um e que por isso participava da história de forma normal e comum, chegando até a ser tentado. As parábolas mostram que o cristianismo é uma práxis para com a comunidade em geral.

Um evangelho voltado para o social

Cristo é visto como sendo um verdadeiro cosmopolita e é apresentado desta forma neste evangelho. Pode-se dizer que é um evangelho universal-gentílico, isto é, Jesus também veio para os gentios 2.29-32. O universalismo apresentado ultrapassa os limites judaicos e é social.
O evangelho de Lucas atinge as classes menosprezadas 14.12,13 e é a boa nova de salvação às suas necessidades. A palavra salvador6 só aparece neste evangelho (1.47-2.11) como também o substantivo salvação7 e o adjetivo salvo8 (7.50). Entretanto esta salvação é para todos, mostrando assim, que o cristianismo é uma religião universal que abrange a todas as classes e estas são encontradas neste evangelho: soldados e publicanos 3.7-14, escravo 7.1-10, samaritano 10.29-37, rico 12.13-21 e o pobre 16.19-31, mordomo 16.1-13, leprosos 17.11-19, nobre 18.1-8, fariseu e publicano 18.9-14, publicano 19.1-10, viúvas 21.1-4, criminoso na cruz 23.39-43 e etc.
Há muitas passagens que narram um interesse pelas questões da vida diária das pessoas, principalmente os excluídos da responsabilidade social e religiosa. No capítulo 15 é dado muita ênfase ao valor do indivíduo em contraste com o tratamento que os judeus tinham e davam aos gentios, significando que todos tinham direito ao Reino de Deus.
As mulheres têm o seu valor resgatado através de uma exposição simpática da sua importância dada por Jesus: Maria, Isabel mãe de João 1.5,6,39-47, Ana a profetisa 2.36-38, Marta e Maria, a viúva de Naim, a mulher pecadora, a mulher samaritana; mulher imoral 7.36-50; mulheres que viajavam com os discípulos 8.2,3; que choraram a morte de Jesus 23.27,28; que estiveram presentes na cruz e no túmulo 23.55,56; 24.1-11 e as crianças também têm o seu devido valor.
É dado muita ênfase ao Espírito Santo e à sua atuação na vida dos cristãos, mostrando também como agia e o seu ministério. Outra ênfase dada é em relação às orações feitas por Jesus (3.21; 5.15,16; 6.12; 9.18-21,28-36; 10.21; 11.1-4; 18.1-14; 22.31,32,39-46; 23.34,46;) onde mostra que a oração é propriedade e privilégio do cristão, que pode ser feita em qualquer lugar e a todo instante.
Mostra que o cristianismo é de muita alegria e, conseqüentemente, louvores a Deus. Há as poesias musicais, como: Magnificat de Maria 1.46-55, Benedictus 1.67-79, Glória in Excelsis 2.14 e Nunc Dimittis 2.28-32, mostrando que o cristianismo é uma religião de louvor e júbilo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário