sexta-feira, 17 de julho de 2009

Evangelhos: 2º Mateus

Mateus

O evangelho de Mateus está em primeiro lugar nos evangelhos canônicos por causa da sua natureza didática e apologética, do seu estilo claro, explanativo e de fácil compreensão. Por haver tantas citações do Antigo Testamento e das várias seitas da Palestina, conclui-se que foi escrito para os cristão-judeus de fala grega e por isso é considerado o evangelho mais judaico de todos os quatro.

Autoria

A tradição de sua autoria não é tão certa como a de Marcos. Entretanto Eusébio (4o século) cita Clemente de Roma (1o século) e diz que “o primeiro dos quatro evangelhos, que são inquestionáveis, foi copiado por Mateus, que outrora fora um coletor de impostos, mas posteriormente um apóstolo". Também cita Papias (130 d.C.), Irineu e Orígenes, como sendo Mateus o autor.
Mas Irineu afirma, antes de Eusébio, que “Mateus publicou também um evangelho entre os hebreus no seu próprio dialeto, enquanto Pedro e Paulo pregavam em Roma e punham os fundamentos da Igreja". Inácio de Antioquia (115 d.C.), em sua carta a Esmirna, no capítulo 19, refere-se ao autor como sendo Mateus e à narrativa como evangelho.
O nome Mateus significa Dom de Deus. No evangelho de Mateus, o discípulo é identificado como um publicano (9.9); Marcos chama-o de Levi, filho de Alfeu (2.14); Lucas cita apenas Levi (5.27). Conforme Marcos 2.14, Mateus é o publicano, é irmão de Tiago (Mt 10.3; Lc 6.15; At 1.13).
Talvez o evangelho tenha sido atribuído a ele por ser um publicano e que para isso era letrado e estava acostumado a tomar notas. Outro ponto que pode servir para atribuí-lo a Mateus é o episódio do pagamento da taxa do Templo por parte de Jesus (17.24-27).
O vocábulo leuín1 de Marcos 2.14 e de Lucas 5.27 pode ser traduzido como levita e não como Levi, neste caso, indicaria que Mateus pertenceria à tribo de Levi. Sendo levita, faria parte da classe sacerdotal que em Jerusalém era poderosa. O conservacionismo, o interesse pela lei oral e pela tradição, pelos fariseus e escribas e pela escatologia tradicional faziam parte da prévia formação de um levita.
Há pouca coisa acerca de sua obra depois do provável evangelho, mas há várias histórias que dizem que ele evangelizou a Etiópia, Macedônia, Síria, Pérsia e Média, e também, que as igrejas grega e romana celebraram o seu martírio. Não se deve confundir Mateus com Matias, o 12o discípulo, que substituiu Judas, o Iscariotes. Mateus é mencionado pela última vez no NT em Atos 1.13.

Local e Data

Não é possível afirmar, mas acredita-se que tenha sido escrito no meio judaico-cristão, impregnado com influências e costumes bíblicos e onde o grego era falado normalmente.
Entretanto, conforme a natureza judaica do evangelho, é possível que o mesmo tenha sido escrito na Palestina ou na Síria, mais provavelmente na Antioquia, local onde os discípulos, habitantes da Palestina, haviam imigrado (At 11.19,27). A preocupação pelos gentios é muito importante para tal hipótese, porque na Antioquia, estava a igreja local a qual enviou Paulo e suas missões aos gentios. Nas suas citações, Papias e Inácio concordam com isso e a igreja de Antioquia foi a primeira a ser constituída por membros que falavam tanto o aramaico como o grego.
Em relação a data acredita-se que tenha sido concluído por volta de 115 d.C., quando Inácio, bispo de Antioquia da Síria se referiu a ele em sua carta a Esmirna. Eusébio citou Clemente de Roma como se tivesse referido ao evangelho em 110 d.C. Mas ao levar em consideração que Marcos seja a sua fonte de textos e outros que estão no evangelho, acredita-se que tenha sido escrito entre os anos 65-75 d.C.
É quase certo que antes da primeira dispersão dos cristãos de Jerusalém não tenha sido, porque os apóstolos ainda estavam por lá; também depois da destruição do Templo não é muito certo, porque senão seria feito uma referência ao fato como sendo consumado (Mt 24.1-28). É por isso que o ano da destruição do Templo é importante, pois se houvesse ocorrido qualquer eventualidade o evangelho narraria o fato.

Propósito e Mensagem

Com exceção das narrativas de Jesus Cristo, Mateus coloca o seu material na estrutura de Marcos. Este plano é visto como uma seqüência normal da vida e do ministério de Jesus, desde o início do seu ministério público até a sua ressurreição. Isto abrange o ministério em toda a Galiléia (4.12-13.58) tanto dentro, como ao redor dela (14.1-18.35), no caminho para Jerusalém (19.1-20.34) e em Jerusalém (21.1-28.8).
Da mesma forma que os outros evangelhos, Mateus não é uma biografia de Jesus. Entretanto em cada um dos livros há uma seqüência natural de eventos desde o nascimento até a ressurreição. Nota-se que não há uma preocupação nos detalhes que envolvem a vida, a infância e os detalhes físicos de Jesus. Isto acontece porque os autores dos evangelhos estão mais preocupados em falar do ministério de Jesus até a sua ressurreição e cada um tem um propósito específico.
Em Mateus há um interesse na história e nos eventos reais. A realidade do evangelho depende da realidade histórica dos acontecimentos que cercam a vida, morte e ressurreição. Por causa da sua fé, Mateus mostra a salvação de Deus, através dos ensinamentos e do ato de Cristo para o homem pecador e também mostra que Jesus é o Messias, o Cristo esperado por Israel.
O povo de Israel esperava um Messias que restaurasse a nação de Israel de uma forma política e um grande líder que governaria o mundo e daria a independência política. Acredita-se que este evangelho tenha sido escrito próximo à guerra judaico-romana, que estava sendo ocasionada por nacionalistas fanáticos que queriam introduzir o Reino Messiânico de forma precipitada e forçosa, antes da destruição do Templo. Por isso o autor tenta mostrar à comunidade judaico-cristã que Jesus é o Messias, mas não o Messias político esperado e sim um servo que sabe conviver com as pessoas. Jesus é o Cristo, o verdadeiro rei messiânico, a esperança de Israel e de todo o mundo. Este é o propósito específico e central do evangelho de Mateus.
Nota-se que o autor se preocupou em utilizar um sentido claro e explanativo para que fosse facilmente adaptado para a leitura em público, como uma forma litúrgica.
Dentro do propósito do evangelho há uma ênfase kerygmática, isto é, sobre o conteúdo da pregação, do evangelismo. Ele preserva todos os elementos da pregação apostólica primitiva. Há interesse não só em evangelizar os judeus (10.5,6; 15.24) mas também aos demais (8.11; 24.14; 28.19). Por isso há uma demonstração do cumprimento da profecia através da descendência davídica, do nascimento, da vida, da morte, da ressurreição, da ascensão e da promessa da volta.
Pode-se observar que a forma didática é bem exposta neste evangelho. Como o Messias, Jesus Cristo, demorava na sua volta, os seus seguidores acomodaram-se e para que não esquecessem os seus ensinamentos e não soubessem como passá-los para os demais, o autor coloca as instruções necessárias e didáticas (evangelismo, ética, disciplina, adoração, escatologia, apologética e métodos de ensino). As unidades contidas no evangelho servem tanto para estudos independentes como para o livro num todo.
Há também um propósito apologético, isto porque havia uma crescente tensão entre o cristianismo e o judaísmo. Mateus mostra claramente a rejeição por parte dos judeus, principalmente dos que estavam em Jerusalém, em relação à Cristo. Também mostra que Jesus Cristo é o filho de Davi e que o judaísmo só sobreviverá por meio do movimento cristão. Relata que o propósito de Deus é salvar o mundo através de Jesus Cristo.
A narrativa encontrada em Mateus serve para ajudar os cristãos judeus a entenderem quem é Jesus Cristo, por isso é sempre apresentado como o verdadeiro Messias de Deus. Em todo o evangelho de Mateus Jesus é apresentado como o Mestre e é demonstrado a sua capacidade de ensino (7.28,29; 8.19; 9.11; 12.38; 17.24; 19.16; 26.18), como também a sua autoridade e é considerado o Mestre por excelência. Também é considerado como profeta dentro dos moldes de Deuteronômio 18.15,18. Este profeta deveria ter a mesma autoridade de Moisés, mas nunca ser um novo ou o que dá uma nova lei (5.21,22,27,28,31,32,38,39). Jesus cumpre a lei de Moisés e ressalta o propósito original dela, que é ser composto dos princípios pelos quais o caráter de uma pessoa pode ser dirigido. Também é apresentado como o Filho de Deus (14.33; 16.16; 27.54), por isso o evangelho sempre narra que Jesus diferenciava o tratamento ao pai, "meu pai" e "vosso pai".
O evangelho relata também que Jesus prefere ser chamado de "Filho do Homem", conforme Daniel 7.13-18, do que Messias (kristós2). O Filho do Homem realizou o ministério como servo dando a vida e não tirando-a dos inimigos de Israel. Através deste título, Jesus cumpre as promessas feitas a Abraão, estabelece o trono de Davi para sempre, tem autoridade para trazer todas as nações sob o seu justo domínio, cria um novo povo e estabelece o Reino de Deus (Basiléia tou Teou3). Isto significa que ele é tudo o que a lei pretendia que um Messias fosse.
A expressão Basiléia tou Teou, isto é, o Reino de Deus é referência à soberania de Deus sobre toda a criação (12.18; 19.24; 21.31,43). A expressão Basiléia significa que Deus é rei independente de que alguém creia nisso, de que haja sudito. Demonstra que ele é o mesmo no AT, no NT e para o futuro do seu novo povo.
Mateus faz uma ligação com Rute 4.18-22, onde a linha messiânica termina com Davi, unindo-a à pessoa Jesus Cristo. Este evangelho é dificilmente organizado para mostrar como o Messias atendeu à chamada que o trouxe ao mundo e só em Mateus é encontrada a expressão "Reino dos céus"4.
Através do Sermão do Monte, o qual em Mateus é descrito de forma mais completa de todos os evangelhos, mostra que Jesus veio "cumprir a lei e não destruí-la" (5.17); mostra que a lei é para uma questão de humanização e não egoísmo, pois é uma questão que começa do interior para o exterior e não apenas exterior. Significa que todos deviam ouvi-la, através dos seus ensinamentos e pô-la em prática (7.23,24).
Como era o Filho de Deus, o Messias, o evangelho narra seus milagres provando que ele era superior aos deuses existentes no Panteão Greco-Romano. Nos capítulos 11 e 12 são apresentados ensinamentos que falam sobre Jesus como sendo o Filho de Deus5 e o seu propósito como Messias. Jesus é apresentado como huiós porque esta era a forma de filiação correta. Se Jesus fosse visto apenas como um dos deuses do Panteão seria apenas um procriador e não um criador.
As parábolas contidas neste evangelho (13.1-53), servem para explicar o que seria o Reino dos céus (13.11). Nos capítulos seguintes é apresentado a rejeição pelos judeus e como Jesus os ensinara através da demonstração da sua autoridade como Filho de Deus.
Ao acreditar que o evangelho foi escrito para os judeus cristãos que estavam em Antioquia, deve-se entender que Mateus quer mostrar que Jesus é o Messias prometido no AT, conforme a lei e esperado por eles, isto mostra novamente que é um evangelho bem didático.
Os ensinamentos de Jesus contidos neste evangelho são correspondentes à Lei de Moisés. É feita uma organização editorial dos ensinamentos de Jesus, o seu conteúdo ético e a sua ênfase sobre o discipulado mostram que este evangelho mais parece um manual para recém convertidos, para uma nova igreja, isto é, judeus convertidos, firmando-os na fé. É o único evangelho que utiliza o termo igreja6 (16.18; 18.17).
O evangelho de Mateus faz com que caia as (teorias) acusações sobre: a filiação ilegítima de Jesus, ter aprendido artes mágicas no Egito e os discípulos furtarem o corpo de Cristo (28.11-15).
Através da Comissão dos discípulos (28.18-20) é demonstrado que o evangelho é para todos no mundo e não exclusivamente para os judeus. Até os números citados em Mateus tem um significado conforme a cultura judaica.

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