sexta-feira, 17 de julho de 2009

Evangelhos: 1º MARCOS

Marcos
Apesar de constar nos evangelhos canônicos como sendo o segundo livro, o evangelho de Marcos é considerado pela maioria dos estudiosos como o mais antigo, neste caso, o primeiro. Isto porque 90% de Marcos é reproduzido em Mateus e Lucas, sem contar que a sua sintaxe é ruim.
O evangelho de Marcos é o mais curto e o mais simples. É conciso, claro e direto, tem um estilo que agradava à mentalidade romana, isto é, não gostava de abstrações e fantasia literária. Por isso pode-se notar que insiste pouco na lei e nos costumes judaicos e quando os menciona é de forma mais explicada. Neste caso, era apropriado para o cristão de mentalidade romana prática.

Autoria

É considerado um evangelho anônimo porque não consta em seus escritos quem tenha sido o possível autor.
No 2o século foi atribuído a João, chamado Marcos, filho de Maria (At 12.12,25). Na sua casa muitos estavam reunidos em oração (este talvez fosse o local de reunião dos dirigentes cristãos de Jerusalém) em favor da libertação de Pedro. Nota-se, então, que João Marcos estava bem relacionado com os cristãos no início do cristianismo. Não se sabe exatamente a sua idade, apenas que era novo e que o nome João1 é judeu, e Marcos2 é romano, que significa martelo.
É o mesmo Marcos que Barnabé e Paulo levaram na 1a viagem missionária, primo de Barnabé (Cl 4.10) e que deixou ambos em Perge para retornar à Jerusalém (At 13.13). Também foi recusado por Paulo, ao viajar novamente com eles, na 2a viagem missionária (At 15.37). Entretanto, mais tarde estava com o mesmo Paulo na igreja de Colossos (Cl 4.10,11 e Fl 1.24). Em II Timóteo 4.11 é Paulo quem pede a Timóteo para levá-lo a Roma. Também está junto com Pedro e Silas (Silvano) em Babilônia — Roma (I Pd 5.12,13).
Papias, discípulo de Policarpo, disse que Marcos coletou o seu material de Pedro:
"E o ancião disse isto também: Marcos, tendo-se tornado o intérprete de Pedro, escreveu precisamente tudo o que lembrara das coisas ditas e feitas pelo Senhor, mas não em ordem. Pois nem ele ouvira o Senhor, nem o seguira, mas posteriormente, como eu disse, Pedro adaptou os seus ensinos às necessidades (de seus ouvintes), mas não como se ele estivesse redigindo uma narração associada aos oráculos do Senhor. Assim, Marcos não cometeu nenhum engano ao registrar, desta forma, algumas coisas exatamente como ele se lembrou delas, pois ele tomou todo o cuidado para não omitir nada que ouvira e para não fazer nenhuma declaração falsa".
Irineu ratifica isto ao dizer que “depois da morte de Pedro e de Paulo, Marcos nos transmitira por escrito as coisas pregadas por Pedro".
Justino Mártir cita o evangelho como sendo as "memórias de Pedro". Clemente de Alexandria afirma que Pedro ainda estava vivo quando Marcos o escreveu e que os ouvintes de Pedro insistiram com Marcos para que deixasse um memorial da doutrina que Pedro tinha falado e que autorizasse que o evangelho fosse lido nas igrejas.
Orígenes, sucessor de Clemente, disse que Marcos escreveu o evangelho conforme Pedro ia-lhe explicando. E, ainda, Eusébio disse que ele fundou as igrejas em Alexandria. Outro que também confirma a autoria a João Marcos é Jerônimo.
Há alguns que o consideram como sendo o intérprete de Pedro, isto significa que recebeu de Pedro dados concernentes à vida de Jesus que lhes serviu de primórdios para o seu evangelho. Realmente pode-se notar em suas narrações uma ênfase dada a Pedro.
Conforme a opinião de João Crisóstomo, no Egito ou segundo outras fontes em Antioquia, com certeza o seu autor era um hebreu, um semita que falava as línguas da Bíblia (hebraico e aramaico) e que aprendera o grego como uma terceira língua, a qual manuseava sem muita habilidade e isto se nota pela sua escrita.
Mesmo assim, apesar de todas essas citações serem de confiança não é possível confirmar a autoria deste evangelho.

Local e Data

De acordo com os pais antigos Marcos escreveu o evangelho quando estava na Itália, especificamente de Roma. Há três hipóteses para esta referência como local da escrita, já que o NT diz que Marcos esteve com Paulo e talvez com Pedro em Roma, as hipóteses são: se Paulo escreveu a epístola aos Colossenses estando em Roma, Marcos estava com ele; se escreveu II Timóteo e se Timóteo fez o que Paulo pediu, Timóteo e Marcos talvez chegaram a Roma antes da morte de Paulo; se a Babilônia citada em I Pedro 5.13 é uma referência judaico pseudônima a Roma, significa que Marcos estava em Roma com Pedro quando a carta foi escrita.
Por ter sido mencionado nas cartas de Paulo e de Pedro e, com o testemunho de Clemente de Roma é provável que Marcos estivesse em Roma. Outra questão é que há alguns latinismos (palavras latinas emprestadas ao grego) no seu evangelho, como em Marcos 12.42, onde é explicado o valor de uma moeda grega3 e esta é comparada com a romana cunhada4.
Em Marcos 15.21 os filhos de Simão Cireneu, Rufo e Alexandre, são mencionados dando a entender que eram bem conhecidos dos leitores e, conforme a carta de Paulo aos romanos (Rm 16.13), Rufo estava morando em Roma. Entretanto não se sabe se o evangelho de Marcos foi escrito antes ou depois da morte de Pedro. Se Mateus e Lucas tomaram, realmente, o evangelho de Marcos como base para os seus escritos, então a data seria antes da produção dos sinópticos. Mas se levar em consideração que foi escrito quando Nero perseguiu os cristãos ou entre a crise da Judéia e Roma, pode-se acreditar que fora escrito por volta de 65 d.C.
Os mais antigos testemunhos acerca do evangelho de Marcos estão ligados à pregação de Pedro em Roma em 70 d.C. Neste caso pode-se datá-lo entre 63 e 70 d.C.

Propósito e Mensagem

Em 64 d.C., um incêndio destruiu metade de Roma, os historiadores da época tinham certeza que Nero, imperador romano, havia ordenado o incêndio em bairros pobres com a finalidade de construir novos e mais bonitos prédios. Quando a culpa começou a ser-lhe atribuída, Nero procurou alguém para culpar e escolheu os cristãos, pois eram suspeitos de serem canibais porque: comiam a ceia do Senhor, eram imorais por gostarem de festas de amor (ágape) e eram contra a comunidade porque só eram leais a Jesus Cristo.
Em seus anais, Tácito, historiador romano, escreveu que Nero fez dos cristãos bode expiatório acusando-os de incêndio culposo e ira contra a comunidade.
O Coliseu em Roma ecoou com os gritos de 60.000 pessoas que escutaram o martírio dos cristãos. As vias públicas testemunharam as crucificações e piras funerais; uns foram rasgados em pedaços por cães selvagens, outros crucificados e outros queimados vivos para iluminar os jardins de Nero.
Com tais perseguições e acusações tão sérias contra a comunidade cristã, surgiu uma necessidade de fazer uma declaração clara e completa acerca de Jesus Cristo que morreu numa cruz romana.
Com a morte do apóstolo Tiago, irmão de Jesus em 62 d.C. e, Paulo e Pedro estando também prestes a morrer, sentiu-se a necessidade de haver um registro do ministério de Jesus Cristo, caso contrário não haveria conhecimento sobre tal. Por isso o evangelho é construído sobre o kerigma5 (proclamação, pregação), isto é, a mensagem pregada pelos apóstolos através da práxis.
O evangelho de Marcos não fala sobre o nascimento de Cristo, não lhe faz descrição física, não tem referências à sua família e nada a respeito da sua infância. Nota-se que não é uma biografia porque não visa fornecer dados sobre a sua vida particular. No entanto é uma narrativa histórica que expõe um quadro representativo da pessoa e das obras do Senhor Jesus Cristo. Estas são as principais fontes de interesse e a pessoa de Cristo domina a narrativa em toda a sua extensão. O primeiro versículo do Evangelho de Marcos diz tudo "princípio do evangelho de Jesus Cristo, filho de Deus".
O vocábulo evangelho evangelion6 significava a recompensa pela boa nova, mas depois veio a significar a própria boa nova. É a tradução do hebraico bissar7 (anunciar as novas de salvação). A boa nova de salvação é a vida, morte e ressurreição entendida através dos ensinamentos de Jesus Cristo. É a libertação dos povos oprimidos.
O início deste evangelho mostra de forma abreviada a preparação de Jesus para o seu ministério e também é apresentada de forma abreviada a sua vida. Nota-se que tanto a pregação de João como a tentação não são descritas com seus pormenores. Entretanto mostra a sua autoridade, dentro do esperado pelos judeus.
Esta autoridade é demonstrada com uma série de acontecimentos narrados: seu poder em perdoar pecados (2.1-12); que era Senhor do Sábado (2.23-3.6); seu poder sobre os elementos da natureza (4.35-41); seu poder sobre a morte (5.21-23,35-42); atuava como o verdadeiro filho de Deus, ou melhor, o filho do homem.
A maior parte dos seus ensinos e milagres sempre lhe criava pressão que tinha de resistir. Quando é relatado que se retirou para Siro e Sidon (7.24), povo gentílico e que não o conhecia tanto, Jesus mostra o seu amor por todas as pessoas e também a sua sabedoria ao responder a certas perguntas. Embora seja relatado muito do seu ministério demonstrando a sua autoridade como filho de Deus, há relatos que demonstram a necessidade de se retirar para orar, ensinar aos seus discípulos em particular e dizer-lhes que devem se preparar para a morte. Todavia Jesus sempre demonstrou a sua atitude de serviço a Deus e aos homens (10.45). Os milagres estão quase sempre ligados a qualquer necessidade humana definida e são realizados para alívio de qualquer emergência.
Mas é no final do evangelho que se nota a importância que o autor dá a Jesus, dando a entender o por quê de uma pessoa tão humana e maravilhosa como ele e com tal autoridade deveria ter um fim tão desumano e ignóbil. Mas, logo em seguida, dá a resposta a este questionamento subjetivo.
Os cristãos da época estavam sofrendo por amor a Cristo, mas a batalha tão temida na época, entre Deus e Satanás, a luta cósmica já estava ganha porque Jesus venceu os demônios (Mc 1.24-28). Neste caso Jesus é o Messias.
Marcos é o evangelho da ação e não dos longos discursos. Fala-se muito nas vitórias de Jesus sobre os demônios, porque o povo da época os temia. O reino de Deus é apresentado como invadindo o reino do mal e vencendo-o de forma rápida e imediata. Por isso o evangelho de Marcos é uma chamada à fé, isto é, à adesão a Jesus como o próprio Deus (Mc 5.36; 11.22) e ao discipulado do Messias.
Para Marcos o tempo está cumprido e próximo está o reino de Deus. Há uma ênfase à promessa do reino de Deus e ao Rei-Messias. Marcos mostra o Messias, Jesus Cristo, como humano e como um sofredor para chegar a sua glória.
O fim do evangelho deixa o leitor tomar a sua própria decisão a respeito da personalidade que é arrebatada como homem. Enfim, é realmente um evangelho de salvação para os cristãos romanos que estavam num período de perseguição.

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